segunda-feira, 29 de setembro de 2025

 

A Partilha

Apresentamos neste post o resultado de um diálogo, por ocasião da reunião mediúnica no Grupo Espírita da Fraternidade, que temos oportunidade de compartilhar com nossos companheiros. Como sempre dizemos, nestes diálogos, sempre encontramos muitas lições para nosso crescimento espiritual.

 - Seja bem-vindo a nossa reunião.

 - Reunião do que?

 - Reunião para fazer uma oração para o irmão, conversar, estender a mão.

 - Pensei que já fosse a reunião da partilha, não é?

 - Por enquanto não.  

 - Estou aguardando.

 - Em família? 

 - É. Então é reunião do quê?

 - Esclarecimento.

 - Da partilha?

 - Vamos falar sobre ela também, mas não só. Outra coisa não lhe ocupa a mente além da partilha? Falei, tentando encaminhar o diálogo.

 - Não senhor.

 - Não?

 - Não senhor?

 - Qual o seu lugar na família? É filho?

 - Sim.

 - E seu pai?

 - Já se foi.

 - E sua mãe?

 - Já se foi também.

 - Há tempo?

 - Sim.

 - E por que agora vocês resolveram fazer esta partilha?

 - Porque estava tudo muito desorganizado.

 - São em muitos irmãos?

 - Sim somos em sete irmãos.

 - Você está vindo de onde, que mal lhe pergunte.

 - Eu estou na minha casa.

 - Olhe bem ao redor. Procure verificar se está realmente na sua casa. O que consegue enxergar?

 - Ué realmente não é minha casa. Mas eu não saí de lá.

 - Foi trazido aqui.

 - E também ninguém me buscou. Não recebi esta informação que alguém me buscaria. Eu estava bem acordado.

 - O fato é que você não está mais lá, concorda comigo?

 - É, é verdade. Isto aqui está muito estranho, muito estranho.

 - Por isso que você está aqui para receber esclarecimentos. Você não irá mais, no momento, participar da partilha.

 - Ah!!!! Como não? Eu esperei tanto por isso, não vejo a hora de pegar o que é meu por direito.

 - Mas geralmente, quando estamos na Terra não contamos com o imponderável e sempre acreditamos que a morte sempre é para os outros, nunca nos alcançará.

 - É, mas eu ainda sou muito novo.

 - Você já foi em alguns velórios de amigos alguma vez? Dos seus próprios pais? Ficou sabendo de mortes de crianças?

 - Sim, sim, isso acontece 

 - Isso pode acontecer conosco, não somente com os outros. Está entendendo o que eu estou tentando lhe dizer?

 - Ah, mas eu estou muito bem de saúde, graças a Deus. Meu corpo é saudável. Eu não tenho nada assim que poderia me adiantar a partida…

 - Até os mais saudáveis também partem, meu irmão.

 - Não me venha com essas conversas.

 - Olha ao seu redor. Procure ver onde você está e pergunte para mim.

 - Eu não sei onde eu estou… Esse lugar não me é nada….

 - ...familiar?

 - Sim, familiar, conhecido. Nunca estive num lugar assim com essas pessoas, pessoas tristes. Eu não sei como eu vim parar aqu, isso sim.

 - Se veio até aqui é porque está precisando.

 - O que eu sei é que está chegando o dia da partilha.

 - Sinto muito ter que lhe dizer isso, mas, a partilha já ocorreu.

 - Como já foi? Imagina! Aliás, quem é o Senhor, afinal? 

 - Eu sou uma pessoa que está tentando lhe ajudar, fornecendo esses esclarecimentos.

 - Me ajudando? Esclarecendo? Você está me tirando a paz. Além de tudo, ainda quer me trazer uma perturbação desta.

 - Geralmente é assim que pessoas que ignoram a situação como você, nos consideram, mas depois que descobrem a real situação, mudam de opinião. Infelizmente você não faz mais parte dos considerados vivos na Terra. 

 - O senhor deve estar enganado deve estar falando com outra pessoa, pois veja, o Senhor não está falando comigo? - falou irritado, aumentando o voluma da voz - eu não estou aqui sentado conversando?

 - A morte é somente para o corpo físico a alma é imortal continua viva, tentei amenizar.

 - Que alma coisa nenhuma. É tudo uma coisa só, não há duas coisas. Morreu acabou e eu estou aqui vivo. Muito vivo. 

 - Graças a Deus! Você está vivo enquanto alma que você é. Houve um velório e o seu corpo foi sepultado.

 - Como, se eu estou vendo aqui meu corpo e o senhor também está; senão não estaria falando comigo agora. Nossa, mas que assunto mais desagradável para um dia como esse? 

 - Eu considero também um assunto que é desagradável, porém necessário, muito necessário. Você precisa abrir os seus olhos para enxergar.

 - Mas os meus olhos estão bem abertos, estou vendo perfeitamente.

 - Não são a seus olhos físicos que estou me referindo, meu irmão.

 - É alguém que mandou você aqui? Quem lhe enviou aqui para trazer essa confusão? Foi um dos meus irmãos? Pode me dizer, pois que eles são bem desse tipo mesmo. O senhor quer tirar a minha paz, me deixar desorientado, estão querendo armar alguma coisa para mim; esse povo é bem capaz de muita coisa.

 - Talvez tenha sido um dos seus pais que esteja intercedendo por você.

 - Eu já disse para o senhor que eles já se foram.

 - Então..., agora você se encontra no mesmo lado que eles estão.

- Que outro lado o que? Não existe outro lado. Só existe um lado, com a morte tudo se acaba – rebateu se irritando novamente.

Nessa hora, solicitamos em prece, que fosse permitido pelos amigos espirituais, que coordenam os nossos trabalhos mediúnicos, que fosse apresentado a esse irmão a cena do seu próprio funeral.

Enquanto isso, o irmão descrente e materialista, permaneceu murmurando palavras um tanto desconexas. Voltei a lhe dirigir a palavra.

 - Veja irmão essa cena que eles estão lhe mostrando.

 - Certo, eu vou assistir, estou vendo muita gente em casa, muita gente chegando na minha casa. Eu nem consigo chegar lá de tanta gente. É uma festa? Não, não é uma festa, porque as pessoas estão com semblante tristes, parecem chateadas. Por que será que isso está acontecendo?

 - Com a permissão de Deus e dos amigos espirituais, vá se aproximando até o centro da sala da sua casa para verificar.

 - O que é isto quem está fazendo? Essa….

 - ...essa magia? – Terminei a frase dele adivinhando sua pergunta.

 - Sim, magia…Ué, sou eu ali? 

 - É isso, seu corpo dentro do caixão, como eu lhe disse.

 - Coisa mais louca, não estou acreditando nessas coisas, não.

 - Infelizmente não posso fazer mais nada. Se estou mostrando o seu próprio velório seu próprio enterro e você não acredita o que mais posso fazer?

 - Eu estou vendo meu pai e minha mãe, estão lá. Eles estão lá.

 - Porque eles também já haviam morrido e estavam participando do seu funeral em espírito, da mesma maneira que você está falando comigo. Os mortos vivem, os mortos falam, os mortos possuem corpos.

 - Eu quero acordar disso, desse pesadelo horroroso. Como é possível? Eles estavam lá, eu os vi. Meus pais!

 - Foi o que lhe disse antes, que eles, provavelmente, estão intercedendo para que você esteja aqui recebendo este esclarecimento. Seus pais não estão mortos, apenas o corpo falece como se fosse uma veste da alma.

 - Eles já se foram a tanto tempo…, falou tristonho.

 - Você não é aquele corpo que estava no caixão. Você é a essência, a alma, e a alma não perece, ela é imortal. Infelizmente, você nunca recebeu esses conceitos fundamentais como parte mínima de uma educação religiosa. Agora, é natural que você tenha essa dificuldade em aceitar que partiu da vida física. Se vocês eram sete irmãos na Terra, agora, lá são seis.

 - Eles irão ficar com tudo? E a minha parte?

- Agora os valores materiais não lhe devem interessar mais. Aqui não são úteis.

 - Eu quero a minha parte, eu aguardei esse momento por tanto tempo. Como que pode morrer desse jeito? – voltou, nosso irmão desencarnado a se rebelar.

 - Morrendo, oras bola! Falei em tom de brincadeira.

 - Estas coisas não têm pé nem cabeça.

 - É o imponderável meu irmão. Nunca esperamos que a lei Divina se execute em nós, sempre para os outros. Como se pudéssemos estabelecer para Deus o dia e a maneira que desejamos morrer, mas as coisas não funcionam assim. Temos que entender que isso faz parte dos desígnios divinos, muitos dos quais, por não os conhecer, não aceitamos. 

 - Isso chega a ser de uma crueldade muito grande.

 - Não irmão, não fale assim. Antes, é de uma justiça muito grande, a qual você não entendeu ainda.

 - Justiça, como?

 - Quem sabe, provavelmente, sua morte lhe poupou de muitos Sofrimentos que o dinheiro poderia lhe propiciar.

 - Ah sim…. você não sabe o que fala mesmo. É mais desajuizado do que eu pensava. Primeiro você fala que eu estou morto.

 - Você constatou… 

 - Depois, me mostra o meu velório.

 - Que você constatou…

 - Mostra meu pai e minha mãe, que já estão mortos e agora fala que a morte me poupou? Não sabe nem o que fala. Eu só preciso de uma coisa – falou convicto - da minha parte da partilha, o resto deixa comigo. Não preciso de ninguém me orientando, ainda mais me mostrando coisas que nem fazem sentido.

 - Já estamos para encerrar nosso diálogo….

 - Eu espero mesmo. Eu quero acordar logo desse pesadelo.

 - Grave bem isso que eu vou lhe dizer. Ao terminar nosso diálogo faremos um convite para que você siga com alguns companheiros para o hospital, para fazer tratamento.

 - Era o que me faltava, ainda vou para um hospital?

 - Sim, aí no mundo dos espíritos, porque você não irá mais acordar na sua casa, você não pertence mais ao mundo dos encarnados.

 - Quer dizer que o morto ainda vai para o hospital? Tá certo….E ainda vou tomar medicação, fazer tratamento. Estou doente que eu nem sei, porque tenho comigo que sou uma pessoa saudável.

- Vamos encerrar aqui o nosso diálogo.

 - Ai que bom, eu agradeço – disse satisfeito.

 - Agradeço a sua atenção e paciência. Espero que você, pouco a pouco, despertando, faça suas orações a Jesus pedindo esclarecimento e proteção.

 - Que orações o que! Já posso ir? Onde eu vou? Como eu faço? Eu não consigo ir sozinho.

- Foi o que lhe disse. Se você aceitar o convite eles o levarão para um hospital; algum lugar onde você possa continuar a receber alguns esclarecimentos.

 - Está bem, eu irei com eles. Boa noite.

 - Boa noite meu irmão, Deus lhe abençoe. Vá em paz.

Desnecessário dizer como é triste constatar o estrago e a ilusão que ambos, a falta da consciência religiosa e o materialismo, ensejam na vida do ser humano, tanto na vida física quanto e, principalmente, na vida espiritual.

Convém que tomemos a lição em primeiro lugar, para nós próprios e coloquemos a barba de molho, pois o despreparo e falta de conhecimento espiritual torna muito feia a coisa do lado de lá.

segunda-feira, 22 de setembro de 2025

 

Estudando sobre o Animismo IV - final

 

Será que Allan Kardec, em O Livro dos Médiuns, preocupou-se com o tema do animismo? Há alguma referência deste assunto na obra que consideramos a mais importante, até então escrita sobre mediunidade no mundo?

Respondemos afirmativamente, no capítulo XIX – Do papel dos médiuns nas comunicações espíritas – ele questiona os espíritos superiores:

 

As comunicações escritas ou verbais também podem emanar do próprio Espírito encarnado no médium?

A alma do médium pode comunicar-se, como a de qualquer outro. Se goza de certo grau de liberdade, recobra suas qualidades de Espírito. Tendes a prova disso nas visitas que vos fazem as almas de pessoas vivas, as quais muitas vezes se comunicam convosco pela escrita, sem que as chameis. Porque, ficai sabendo, entre os Espíritos que evocais, alguns há que estão encarnados na Terra. Eles, então, vos falam como Espíritos e não como homens. Por que não se havia de dar o mesmo com o médium? ”

 

Havia, na época da publicação do Livro dos Médiuns, a crença que o espírito do próprio médium é quem realizava a comunicação e não uma outra entidade, e isso para todos os casos. Kardec faz este questionamento e recebe a resposta:

 

 “Os que assim pensam só erram em darem caráter absoluto à opinião que sustentam, porquanto é fora de dúvida que o Espírito do médium pode agir por si mesmo. Isso, porém, não é razão para que outros não atuem igualmente, por seu intermédio. ”

 

Portanto, em duas questões seguidas, Kardec afirma e confirma que sim, o espírito do próprio médium pode se manifestar, caracterizando a comunicação anímica. Porém, atribuir todos os comunicados mediúnicos somente ao espírito do médium, é um grande erro, segundo nos ensinam os espíritos superiores que ditaram a codificação.

Embora não seja fácil, para distinguir quando o ditado ou a escrita provém de um outro espírito ou do próprio médium, os espíritos superiores disseram a Kardec que a análise da natureza da comunicação, através de um estudo cuidadoso das circunstâncias e da linguagem, pode auxiliar. Ou seja, o médium pode dizer coisas completamente fora de suas ideias habituais, de seus conhecimentos e mesmo do alcance de sua inteligência indicando a possibilidade da presença de um outro espírito a se comunicar, que não o do próprio médium.

Mesmo nesta situação, em que fica patente o protagonismo de um espírito desencarnado na comunicação, sempre haverá animismo, em diferentes graus, nas comunicações mediúnicas, pois é o próprio Kardec que afirma, no citado capítulo XIX:

 

“com efeito, se bem que o pensamento lhe seja todo estranho, e que o assunto seja totalmente fora do âmbito em que ele se move, se bem o que o espírito quer dizer não provenha dele, nem por isso deixa o médium de exercer influência, no tocante à forma, pelas qualidades e propriedades inerentes à sua personalidade”.

 

Pode-se deduzir, portanto, que o Espírito do médium nunca é completamente passivo. Neste particular, Allan Kardec fornece-nos o correto enfoque do que seja “passividade” no tocante ao fenômeno mediúnico:

 

“É passivo (o médium), quando não mistura suas próprias ideias com as do Espírito que se comunica, mas nunca é inteira mente nulo. Seu concurso é sempre indispensável, como o de um intermediário, embora se trate dos que chamais médiuns mecânicos.”

 

          Destaca-se destas citações, a fundamental importância do preparo do médium, de sua qualificação e do quanto “investe” em si mesmo quando falamos da necessidade do estudo constante da Doutrina. Acrescentamos ainda, o cuidado que demonstra com a elevação de seu sentimento ao se integrar nas obras da caridade e de auxílio ao próximo, praticando, no exercício das faculdades, o esforço, a resignação e a disciplina. Todo este preparo, tanto no campo da intelectualidade com no do coração, são imprescindíveis para sermos instrumentos fiéis. E isto independe se estamos atuando como instrumento mediúnico ou anímico.

          Antes de concluirmos este estudo, que já se estendeu por esta quarta parte, quero mencionar a excelente obra do Dr. Odilon Fernandes que estuda, de maneira simples e acessível a todos o animismo. Recomendo fortemente a todos que leiam a obra Mediunidade – Transmissão e Recepção, que, na verdade, poderia ser intitulada Mediunidade Anímica. Dando mostras de sua sensibilidade e conhecimento no campo da mediunidade, Dr. Odilon, pela psicografia de Carlos Baccelli, amplia consideravelmente o entendimento de ser médium.

          Citando Jesus, ele afirma que:

 

“No Divino Mestre a mediunidade anímica se expressa com toda sua sublimidade”

 

Jesus, médium de Deus, pois, em permanente conexão com o Criador (eu e meu Pai somos um), não necessitava de qualquer espécie de intermediação de espíritos, fossem eles da mais elevada evolução.

Jesus, na condição única, aqui na Terra, de perfeito intérprete de Deus, pode, nesta situação, ser considerado médium. Ao demais, todos os fenômenos que ele realizou, caracterizam o fenômeno anímico, tendo sido desnecessário, em sua condição de espírito puro, de intermediários espirituais.

Afirma Dr. Odilon, que o médium anímico realiza a ausculta psíquica de toda a Criação e não somente de espíritos desencarnados e encarnados, e adiciona:

 

“O Homem que desenvolve a mediunidade anímica passa a perceber com maior nitidez e profundidade a vida em torno, logrando percepções de ordem transcendental em relação a tudo que existe”

 

          E, como as leis da mediunidade nos ensinam, que o homem melhorado se torna, gradativamente, melhor médium, deduz-se que, desenvolvendo suas percepções anímicas, o homem aperfeiçoará as mediúnicas.

          Finalizamos com a afirmação do Dr. Odilon na obra referida:

 

“Médiuns existem que, não estando no exercício dessa ou daquela faculdade mediúnica específica, são mais médiuns do que os que dizem sê-lo – sua sensibilidade anímica, embora não direcionada para esse ou aquele campo mediúnica, os coloca em sintonia com a vida. ”

 

          Portanto, amigo leitor, recomendo o estudo aprofundado com demorada reflexão, não restringindo o uso ultrapassado e às vezes mal-intencionado do animismo para atribuí-lo de forma inapropriada e até irresponsável nas reuniões mediúnicas, pois ignoramos muito mais do que conhecemos sobre a mediunidade.

 

(*) Todos os grifos são nossos

 

Referências

(2) Kardec, Allan. O Livro dos Médiuns. Tradução de Guillon Ribeiro. 54ª ed.  Brasília. Editora FEB, 1944. 480p.

(1) Odilon Fernandes.  Mediunidade – Transmissão e Recepção. Psicografado por Carlos A. Baccelli. LEEPP Editora, 2021. 205p.

segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Estudando sobre o Animismo III

 

 

Retomando os estudos e reflexões desta semana recorremos à obra No Mundo Maior, da lavra mediúnica de Chico Xavier, em que o instrutor Calderaro responde à indagação de André Luiz sobre o animismo:

“A consulta exige meditação mais acurada. A tese animista é respeitável. Partiu de investigadores conscienciosos e sinceros, e nasceu para coibir os prováveis abusos da imaginação(...)”

         

Calderaro não condenou os defensores da “tese animista”, pois ela visava combater, no médium sem estudo e sem discernimento, os excessos de imaginação.

Se não condenou, o instrutor fez um importante alerta na sequência de sua fala:

 

“Entretanto, vem sendo usada (animismo) cruelmente pela maioria dos nossos colaboradores encarnados, que fazem dela um órgão inquisitorial, quando deveriam aproveitá-la como elemento educativo, na ação fraterna.

 

          Claramente conhecendo os meandros do animismo como fator inerente ao fenômeno mediúnico, Calderaro exorta os médiuns e os dialogadores presentes às sessões mediúnicas a mais amplo estudo e preparo, inclusive no campo da caridade fraterna. Isso porque, o que deveria ser uma oportunidade de orientação para companheiros que estão em jornada de início na mediunidade, se transforma em julgamento e opressão da parte dos mais “experimentados”. Inclusive, Calderaro compara essa forma de encarar o animismo a “Cérbero” que na mitologia grega, é um monstruoso cão de três cabeças que guarda o reino de Hades, impedindo que as almas dos mortos fujam e que os vivos entrem no mundo inferior.

          Sabemos, é claro, que dentre os percalços enfrentados pelos iniciantes na mediunidade, a dúvida, muitas vezes fomentada pela questão legítima do animismo, está sempre presente. Neste delicado campo de ação, precisamos todos, protagonistas de reuniões mediúnicas, sermos detentores não só do conhecimento, mas também da sensibilidade para orientar. Assim como nos ensina Dr. Odilon Fernandes na obra Mediunidade – Transmissão e Recepção, psicografado por Carlos Baccelli:

 

“Em matéria de mediunidade, toda influência benéfica por parte do médium é sempre bem-vinda, desde que essa interferência, realmente, seja benéfica em todos os sentidos -  ele não será menos médium por isso e nem estará mistificando. ”

         

          Voltando a comentar o capítulo 9 – Mediunidade – Calderaro orienta como agir frente a candidatos com mediunidade nascente:

 

Recolhidos ao castelo teórico, inúmeros amigos nossos, em se reunindo para o elevado serviço de intercâmbio com a nossa esfera, não aceitam comumente os servidores, que hão de crescer e de aperfeiçoar-se com o tempo e com o esforço. Exigem meros aparelhos de comunicação, como se a luz espiritual se transmitisse da mesma sorte que a luz elétrica por uma lâmpada vulgar. Nenhuma árvore nasce produzindo e qual quer faculdade nobre requer burilamento. A mediunidade tem, pois sua evolução, seu campo, sua rota.

 

De grande responsabilidade é o papel do orientador/ coordenador em uma reunião mediúnica. Ter a sensibilidade e experiência para acolher os companheiros em início de jornada no campo da mediunidade e auxiliá-los a aprender a discernir, o que nem sempre é tarefa fácil, o seu, do pensamento da entidade comunicante. Estimula o candidato ao estudo constante e a prática do bem, pois considera sobretudo, que a mediunidade evolui no medianeiro, à medida que este se interessa e investe na própria mediunidade.

O instrutor Calderaro denota preocupação quando certos companheiros, apoiados na tese animista, pretendem atribuir toda a responsabilidade do trabalho espiritual somente sobre o instrumento mediúnico. É preciso reconhecer na teoria e também na prática, que os médiuns não “nascem prontos”. Chico Xavier, se é que podemos especular a respeito, se fez como lídimo seguidor do Cristo, ao longo de muitas jornadas encarnatórias. Faculdades mediúnicas completas são fruto de trabalho e esforço contínuo no campo da auto-educação e do aprimoramento moral, pois ninguém receberá as bênçãos da colheita, sem o suor da sementeira, como assevera Calderaro.

O capítulo é finalizado com expressivo caso sobre o animismo, onde encontramos a médium Eulália, que recebe legítima comunicação de um espírito desencarnado no sadio desejo de praticar o bem, propondo ao grupo de trabalhadores encarnados, realizar plano de socorro a enfermos desamparados. Eulália, de onze médiuns a serviço, era a única que exibia mais adiantado estado receptivo para a comunicação do nobre irmão. Ainda assim, elucida Calderaro:    

 

(Eulália) “não é capaz de elevar-se à mesma frequência de vibração em que se acha o comunicante; não possui suficiente “espaço interior” para comungar-lhe as ideias e conhecimentos; (...) nem haver construído, na experiência atual, as necessárias teclas evolucionárias, que só o trabalho sentido e vivido lhe pode conferir”.

 

Entende-se que Eulália, embora no caminho, necessitava de mais amplo esforço de aprimoramento, inclusive no campo da ciência médica, a qual o comunicante pertencia, para lhe refletir mais fielmente as ideias.

Retrata Eulália, a situação de muitos médiuns colaboradores imbuídos de “boa vontade criadora” imprescindível para ascensão aos planos mais altos, porém a requerer substanciais conteúdos a fim de melhor equipar o próprio aparelho mental.

No desdobramento do caso, a mensagem foi recebida e assinada pelo comunicante, sendo lida para todos os presentes na reunião. Calderaro assim registra a conclusão:

 

“O presidente da sessão, seguido pelos demais companheiros, iniciou o estudo e debate da mensagem. Concordou-se em que era edificante na essência, mas não apresentava índices concludentes da identificação individual; não procedia, possivelmente, do conhecido profissional que a subscrevera; faltavam-lhe os característicos especiais, pois um médico usaria nomenclatura adequada e se afastaria da craveira comum. E a tese animista apareceu como tábua de salvação para todos.”

 

Desnecessário dizer que Eulália abatera-se e entristecera-se profundamente com o “veredito” dos demais companheiros. Após ser atendida pelo instrutor espiritual que, com ternura paternal aplicou-lhe passe e palavras de incentivo e reconforto, a médium, captando as orientações, assume postura de compreensão e recobra novo ânimo a fim de persistir na luta.

Vale a pena, amigo leitor, a leitura integral do original para também entendermos, como participantes rotineiros das sessões mediúnicas que somos, as sutilezas existentes nos ensinamentos dos amigos superiores.

Voltaremos ao assunto no próximo artigo, concluindo esse tema que deve interessar a todos que militam no campo da mediunidade.


(*) Todos os grifos são nossos

 

Referência

(1) Luiz, André. No mundo maior. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. 1ª ed. Brasília. Editora FEB, 1947. 253p.

(2) Odilon Fernandes.  Mediunidade – Transmissão e Recepção. Psicografado por Carlos A. Baccelli. LEEPP Editora, 2021. 205p.

 


segunda-feira, 8 de setembro de 2025

 

Estudando sobre o Animismo - II

 

 

Dando continuidade aos estudos sobre o animismo iniciados no artigo da semana passada, colhemos valiosas informações sobre o assunto no livro Mecanismo da Mediunidade, no qual o espírito André Luiz revela seu grande esforço de registrar, em nosso campo de ação, uma rara obra que estuda em profundidade a mediunidade. 

Na obra, André Luiz define animismo como o conjunto dos fenômenos psíquicos produzidos com a cooperação consciente ou inconsciente dos médiuns em ação. Notemos que a participação do médium pode se dar até de forma inconsciente, como muitas vezes, ocorrem nos fenômenos mediúnicos de natureza física em que à revelia da vontade e do conhecimento, o médium é doador de ectoplasma necessário para o êxito do fenômeno.

Em outras palavras, não há mediunidade sem alma, sem animismo enfim. O médium, de uma forma ou de outra, tem participação no fenômeno mediúnico que através dele se produz.

Concorda comigo, caro leitor deste despretensioso artigo, que o médium deve se importar com sua capacidade de interferir de certa forma, no fenômeno mediúnico com melhor qualidade possível?

Qual sua opinião?

A depender da sua resposta, ela o levará a ser mais ou menos sincero, mais ou menos comprometido com a causa, mais ou menos transparente e mais ou menos munido de desinteresse pessoal na tarefa que abraça. 

O animismo, portanto, como parte integrante do fenômeno mediúnico deve concorrer para induzir, cada vez mais, o médium a se preparar, se aprimorar, se espiritualizar, para, tanto quanto possível, contribuir de forma positiva na ocorrência.

Não devemos, pois, nos preocupar em atacar e criticar o animismo e sim estimular o médium, compenetrado de sua responsabilidade, a desenvolver-se cada vez mais na sua intimidade como criatura humana.

É legítimo o raciocínio que o animismo, no futuro, quando for estudado a fundo, será o revelador de uma força extra-cerebral (perispírito + espírito) que pode se desdobrar para fora do corpo físico e comandar manifestações como consciência pensante e organizadora. E isso tanto para fenômenos de efeitos físicos (materialização) quanto para os intelectuais. Neste último, por exemplo, especialmente quando médiuns encarnados, se manifestam quais se personificassem outras entidades, quando, na realidade, estão a manifestar-se a si mesmas. São, neste caso, personalidades do pretérito do médium a emergirem da subconsciência assumindo durante o transe, postura diferente da presente encarnação, levando o companheiro dialogador da reunião a tratá-lo como se fosse outra entidade espiritual comunicante, quando de fato, não é.

Sob este aspecto, encontramos em Mecanismos da Mediunidade, no item Obsessão e animismo, fato muito curioso esclarecido por André Luiz. Certas inteligências desencarnadas de grande poder mental, exercem domínio sobre mentes frágeis e sem defesa, à semelhança da ação hipnótica, detendo-as, por tempo indeterminado, em certos tipos de recordação, como se nelas estabelecessem o fenômeno da fixação mental mantendo-as em estados anômalos de sentido inferior. Assim, a criatura dominada, qual nos ensinou o irmão Calderaro na obra No Mundo Maior, fixa-se na zona dos impulsos inferiores, em que se demorará por tempo indeterminado, estabelecendo o processo obsessivo.

Trazendo para esta ocorrência o aspecto do animismo aqui estudado, conclui André Luiz:

 

“pessoas encarnadas, nessa modalidade de provação regeneradora, são encontráveis nas reuniões mediúnicas, mergulhadas nos mais complexos estados emotivos, quais se personificassem entidades outras, quando, na realidade, exprimem a si mesmas, a emergirem da subconsciência nos trajes mentais em que se externavam noutras épocas, sob o fascínio constante dos desencarnados que as subjugam.

 

Nesta ocorrência, o irmão atingido, será categorizado pela ciência médica tradicional do mundo, que não enxerga a questão espiritual por trás e dominante, como um “alienado mental”, pois a personalidade que emerge da sua subconsciência é distinta e conflitante com a sua realidade objetiva do hoje.

Creio até que estes casos sejam de ocorrência mais comuns do que imaginamos nas reuniões mediúnicas de enfermagem espiritual. Aliás, poucos são os coordenadores e colaboradores de reunião mediúnica que apresentam suficiente experiência, conhecimento e sensibilidade para discernir quando se trata de uma manifestação anímica ou mediúnica.

Importante destacar que, sendo o espírito comunicante um irmão desencarnado ou o espírito do próprio médium como na situação acima descrita, devem ser abordados e receber nossa colaboração quanto quaisquer outros que se manifestem, exigindo esclarecimento e socorro.

Estagiando em faixa evolutiva ainda muito inferior, somos todos necessitados de amparo superior sem, entretanto, renunciarmos a ajuda dos irmãos que ombreiam conosco a jornada terrena, não é mesmo?

Quem de nós pode atirar a primeira pedra?

Muito bem. Avancemos com nosso estudo e reflexão.

Não somente a alienação mental, mas também os fenômenos da criminalidade, da violência agravada, na maioria das vezes, expressam a queda mental do Espírito em reminiscências de lutas pregressas. São as conhecidas “predisposições mórbidas” em que velhos conflitos d’alma e criaturas que fizeram parte de nosso delituoso passado, transitoriamente adormecido, ressurgem como verdadeiros reflexos condicionados dos estudos de Pavlov, a nos requisitar nossa capacidade de superação.

Destacamos que, nestes momentos cruciais da reencarnação em que voltamos a ser testados, caso estivermos desguarnecidos de elementos morais superiores susceptíveis de alterar nosso padrão mental, de forma quase inapelável, tornaremos lamentavelmente à mesma perturbação ou violência que outrora nos fez falir a alma.

Portanto, como se refere nosso irmão Inácio Ferreira, aliás como médico psiquiatra em sua última encarnação na Terra, possui todo a condição de dizer que devemos “criar créditos” pois desconhecemos como e quando estas situações poderão voltar a nos envolver.

Concluiremos nossos estudos e reflexões sobre o animismo no próximo artigo.

Até lá e bons estudos.

 

(*) Todos os grifos são nossos

Referências

(1) Luiz, André. Mecanismos da mediunidade. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. 8ª ed. Brasília. Editora FEB, 1959. 188p.

(2) Luiz, André. No mundo maior. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. 1ª ed. Brasília. Editora FEB, 1947. 253p.

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